Os Campos de Altitude — também chamados de campos naturais ou estepes — já cobriram uma parte significativa do nosso território. Segundo o IBGE, originalmente 11,6% da área de Santa Catarina era formada por esse ecossistema único, mais antigo até do que a Floresta com Araucárias. Hoje, os números são alarmantes: menos de 2% dos campos permanecem bem conservados.
Esses ambientes não são apenas belas paisagens. Eles são caixas d’água naturais, graças às turfeiras que armazenam e regulam a água, essenciais para a segurança hídrica do estado. Abrigam mais de 1.600 espécies de plantas, muitas delas endêmicas, e uma fauna singular. Estamos diante de um patrimônio natural e cultural de valor incalculável — mas também diante da sua possível extinção. Regiões como os Campos de Palmas, o Campo dos Padres e a Coxilha Rica correm perigo.
A redução drástica dos campos se deve à expansão agrícola, ao avanço de monocultivos de espécies exóticas como pinus e eucalipto, e mais recentemente, a retrocessos na legislação. A revisão do Código Estadual do Meio Ambiente de 2022 restringiu a definição de Campos de Altitude apenas às áreas acima de 1.500 metros, ignorando décadas de conhecimento científico. Com isso, 96% dos campos catarinenses perderam proteção legal.
Essa mudança contraria normas federais como a Lei da Mata Atlântica (Lei nº 11.428/2006) e resoluções do CONAMA, que reconhecem os campos como parte integrante do bioma, independentemente da altitude. Não por acaso, a Procuradoria Geral da República já ingressou com uma Ação Direta de Inconstitucionalidade no Supremo Tribunal Federal contra a lei estadual.
Mais grave ainda é o discurso disseminado em parte da imprensa: que proteger os campos inviabilizaria a economia catarinense. Trata-se de uma falácia. Há décadas, atividades como a pecuária extensiva tradicional e o turismo sustentável convivem com a conservação dos campos. Proteger não significa paralisar; significa assegurar que usos sejam feitos de forma responsável, sem destruir para sempre um ecossistema que levou milhões de anos para se formar.
Perder os Campos de Altitude é perder água, biodiversidade, beleza cênica, cultura e identidade. É abrir mão de serviços ambientais que sustentam a vida. É empobrecer Santa Catarina no sentido mais profundo da palavra.
A proteção dos campos não é um capricho ambientalista: é uma estratégia de sobrevivência coletiva. Cabe ao Judiciário, aos órgãos ambientais e à sociedade civil reconhecer essa urgência. Antes que reste apenas memória do que foram os campos catarinenses.